Pelas praias, pelos pratos de Valencia, tantas conchas. Penso ter me lembrado Neruda, o oceano de palavras do poeta. Em dias em que falar é permanente invenção, escrevi...
Minhas palavras
são minhas conchas
sou carne assustada
na casca das minhas frases
meu grito é esqueleto
e toda argumentação
minhas cápsulas
escrevo as linhas
curvas do meu corpo
torto o meu útero
onde capturo oceanos
minha boca cospe
ossos no caes
onde ancoras faminta
minha língua calcifica
petrifica as sílabas-górgonas
que se enlaçam em tuas redes
meu grito é então pérola
antígeno a preparar
primavera nas tuas mãos
minha prosa me esconde
tu me invertes
me fecho
enquanto o vapor cáustico do
teu desejo me descola
faço um segredo, me calo
tu és o estupro consentido
os dedos que me estragam de assalto
eu faço voto, estaciono, me asseguro, escondo
tu és o pote fervente, o óleo escuro
que me dissolve
eu me encaixo, adormeço na trama
de corais serpentes minhas certezas
tu me distraes, em tapas corta
minhas linhas me faz presa flácida
eu falo, tu me alucinas
eu falo, tu me exterminas
eu falo:
casco férrico
pele pétrea
alma plúmbica
produzo palavra sólida
enquanto oras um caldeirão
em que me esqueço máquina
e lápide
mergulho em ti pra me lembrar
conversa, bossa, plá...
mergulho e flutuo pra me lembrar
que sou antes qualquer palavra
tudo, barata, ave, nada
gente, oco, água, pouco
sou alfabeto
plano e buraco, sou quase.
sei o gosto de ser
qualquer palavra
e sou também ensaio
letras nas mãos de um menino
sou armação, quebra-cabeça, carta-de-amor
rabisco e palavrão,
sou pixação, exo-vontade
sou palavra
que me fala, em
qualquer possibilidade
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